Sunday 17 June 2007

Timor-Leste: José Mattoso considera situação "complexa" e não arrisca prognósticos

Lisboa, 17 Jun (Lusa) - O historiador José Mattoso, que coordenou a organização do arquivo da Resistência Timorense pela Fundação Mário Soares, disse numa entrevista à Agência Lusa que a "actual situação é tão complexa" que não arrisca qualquer prognóstico.

José Mattoso, também autor de uma biografia do líder da resistência Konis Santana (1957-2005), afirmou que "a realidade é complexa, não só actualmente, mas desde sempre".

"Não entendo nada dos timorenses, francamente não compreendo aquele país e aquele povo. Compreendo que Timor é constituído por uma grande quantidade de comunidades unidas por vínculos de tipo clãnico, familiar, que vêm até hoje, e que perduraram como comunidades antagónicas, devido ao seu anterior isolamento. Tinham línguas diferentes, viviam em espaços reduzidos, e cultivavam a agressividade contra os outros como forma de subsistência", afirmou.

O historiador, que leccionou em Timor-Leste de 2000 a 2005, salientou também o facto de os timorense serem "um povo com tradições culturais muito ritualizadas, muito interessantes, mas estudadas de uma maneira muito superficial, exceptuando três ou quatro estudos antropológicos sérios".

José Mattoso, 74 anos, fala de Timor-Leste de forma emocionada e até arrebatadora quando se refere ao papel da Resistência e do seu líder, morto em 1998.

À realidade étnica, Mattoso contrapõe "a realidade dos exilados que lutaram sempre pela independência, não com as categoriais mentais dos reinos e clãs, mas com as dos países de acolhimento, ou os esquemas mentais ocidentais conforme os partidos políticos que os apoiaram ou os apoiantes que encontraram".

Por outro lado, há os guerrilheiros que "tinham direito a ter alguns benefícios da independência, mas tiveram de ficar nas montanhas sem emprego e por vezes, até, com fome".

Segundo a análise do historiador, esta situação "levou muitos guerrilheiros e outros participantes na Resistência clandestina e até membros do clero a questionar: 'Afinal que ganhamos com a independência? são só eles [os que controlam o poder político e económico] e nós nada?'".

"A mãe do Konis, por exemplo, vive na miséria. É o que acontece a muita gente", enfatizou o investigador.

José Mattoso salientou também a "importância do papel que a ONU desempenhou em todo este processo".

Segundo o historiador, a ONU "trouxe pessoal internacional a ganhar muito dinheiro, houve muitos relatórios pagos a peso de ouro, uma intervenção empenhada do Banco Mundial, muitos projectos dirigidos por centenas de ONGs, e os seus funcionários a ganharem salários infinitamente maiores do que os dos timorenses, mesmo dos que com eles colaboravam".

Contudo, "comparativamente, na resolução dos problemas de Timor a ONU gastou muito pouco", sublinhou.

O biógrafo de Konis Santana citou Sérgio Vieira de Mello, representante especial das Nações Unidas no território, segundo o qual "apenas 10% do orçamento da ONU ia para Timor e que os restantes 90% eram para funcionários e outras despesas de manutenção".

"Tal levou a que os timorenses que trabalhavam na ONU e nas ONGs ganhavam muito mais do que os familiares que viviam da agricultura. Isso e o desemprego da grande maioria dos jovens criou situações terríveis de disparidade económica", referiu.

As críticas de Mattoso vão também para o que falhou "no papel da Igreja, que procurou fortalecer-se, dominar as consciências e as orientações sociais, muitas vezes com muito pouco empenhamento no apoio das necessidades básicas e na criação de uma certa cultura popular ou numa ideologia identitária. Não se percebe o que quer a Igreja timorense, nem a sua passividade a respeito da violência".

Mattoso considera que em Timor-Leste "há poucas instituições verdadeiramente empenhadas em compreender os problemas do povo".

A este quadro Mattoso acrescentou "os interesses da China, Austrália e da Indonésia, além das pressões exercidas sobre os chefes dos partidos, e a situação de apropriação de poder político por parte da FRETILIN, pelo facto de ter obtido a maioria absoluta nas primeiras legislativas".

Um outro factor salientado por Mattoso é "a quantidade de jovens desenraizados das estruturas tradicionais, sem emprego, que não vão para a universidade, não estudam, se organizam em grupos de artes marciais, e cultivam uma agressividade que vem do tempo dos seus antepassados".

"Perante tudo isto não se pode traçar um prognóstico", disse o historiador.

José Mattoso foi trabalhar para Timor-Leste através da Cooperação Portuguesa, com o objectivo de recuperar a documentação timorense. Quanto à biografia de Konis Santana, inicialmente era para ser apenas um texto "relativamente curto", disse.

Porém, o que encontrou, nomeadamente no refúgio de Konis Santana, "era tão forte, tão pungente, tão dramático" que entendeu ter "material suficiente para fazer uma história da Resistência".

"Fiz a biografia como forma de contar a história da Resistência. No meu fascínio por Konis, reconheço que há uma atitude um pouco romântica, como aquela que nos leva a admirar personagens como Che Guevara".

O historiador reconhece que foi motivado também por outra razão. "O que me aguçou verdadeiramente a curiosidade, foi perceber como é que aquele povo, meia dúzia de pessoas, sem nada, sem recursos nenhuns, acossados por todos os lados por um exército poderosíssimo, com as armas mais sofisticadas, com todos os recursos, e ainda por cima com o apoio internacional, consegue aquilo - a independência. Por isso falei em 'milagre'".

"Situações como esta, aparentemente inexplicáveis, são muito atraentes para um historiador", declarou.

10 comments:

Anonymous said...

A libertação é uma luta e em todas as lutas há os que se cansam e desistem, há os que mudam de ideias e traem e há os que persistem.

Basta ver que na luta pela libertação de TL alguns desistiram, outros mudaram mas que o Mari e o Lu-Olo persistem e com ele o grosso dos seguidores da Fretilin e também outros patriotas Timorenses.

E hão-de continuar contra ventos e marés a lutar pela efectiva independência e soberania nacional. Disso não tenham dúvidas.

Porque a história da Fretilin é uma história de luta – luta em todas as situações, travando as batalhas necessárias em cada momento. E sabendo sempre que, quando se luta nem sempre se ganha, mas quando não se luta perde-se sempre. Ou como disse um grande português “fustigados pelos ventos da ofensiva, mas sempre no rosto e no peito e nunca pelas costas”.

Anonymous said...

Sim continuam a lutar para que grande parte dos contratos de empreitadas vao para as maos dos irmaos de Mari Alkatiri ou de Fretilinos os quais estao cada vez mais ricos!...

Anonymous said...

Há gente que quer continuar que os estrangeiros ponham e disponham em Timor e que para isso trabalham pela surra.

Ainda na semana passada o Mari desafiou os do CNRT para discutirem com ele na televisão, rádio ou em qualquer jornal tudo sobre a corrpção em TL mas até à data não houve resposta.

Também o Mari desafiou toda a oposição para discutir como governar a nação, particularmente a gestão económica e também de todos está à espera da resposta.

Mas a oposição é sonsa e manhosa - não aceita os desafios para debates olhos nos olhos - e em vez disso vem para aqui com boquitas cobardes.

É este o período para se discutir tudo às claras, porque é que não o fazem?

Mau Lear said...

Quando estiveram no poder nao quizeram discutir nada com ninguem. Sobranceiros e arrogantes, os "UNICOS" patriotas de TL, salvaram a Nacao desde a gestao economica ateh ah distribuicao de armas a civis que julgavam fieis ao partido, e a eles proprios. NAO CHEGOU? Falta-nos aqui em TL um cantor que saiba cantar aquela musica "ELES COMEM TUDO, ELES COMEM TUDO, ELES COMEM TUDO E NAO DEIXAM NADA".
Manuel Carlos

Anonymous said...

Manuel Carlos: explique então s.f.f. como é que a Fretilin conseguiu aprovar a Constituição se não chegou a ter os dois terços necessários? E como é que conseguiu aprovar leis importantes por UNANIMIDADE como por exemplo a do Fundo do Petróleo?

E quanto à distribuição de armas repare que nem sequer a Comissão de Inquérito da ONU se atreveu a acusar a Fretilin de tal coisa mas em contrapartida muito antes do ministro do interior de então ter distribuído umas poucas armas a pisteiros da PNTL, está preto no branco no tal inquérito que o Alfredo e os seus boys desertaram no início de Maio do ano passado com ARMAS, MUNIÇÕES e VEÍCULOS MILITARES!

Mau Lear said...

Se eram necessarios dois tercos, (julgo que se refere ao foro da PN) para a Constituicao ser aprovada e a Fretilin conseguiu essa aprovacao sem esses dois tercos, entao a Democracia nao foi usada nessa aprovacao, e a Constituicao nao eh legal. Pode-me esplicar como eh que a Fretiln tirou esse coelho da cartola?

Quanto ah distribuicao de armas por civis (pisteiros ou nao pisteiros eram civis) temos aih "pano para mangas".

Vamos por partes: Conforme declaracao do proprio ex-primeiro Ministro o Camarada Jose Luis Guterres, teria de sair de Ministro dos Negocios Estrangeiros e Coperacao porque O GOVERNO NAO PODE TER OPOSICAO INTERNA. SOH UMA PALAVRA E UMA ACCAO. E lah foi o Kamar...ada Joseh Luis engrossar as hostes do CNRT.Mas nao eh este o problema que se estava a falar.

Porque serah entao que o Ministro da Administracao Interna, e nao soh, VICE PRESIDENTE DA FRETILIN tambem,distribuiu armas a pisteiros (ou serah pistoleiros(?)), sem o conhecimento do CCF e do Governo onde "NAO PODE HAVER OPOSICAO INTERNA).

Sao coisas que me fazem pensar na maxima EM TIMOR TUDO SE PROVA E NADA SE PROVA.
Manuel Carlos

Mau Lear said...

Esqueci-me de lhe dizer que o Alfredo ateh era MILITAR, era normal que utilizassem as ferramentas da profissao. Mas sabe-me dizer jah que falou de veiculos, quanto milhares de dolares custaram os carros que o Ministro distribuiu pelos pistoleiros e como entraram em Timor armas civis para serem distribuidas a pisteiros civis? (e o povo a passar fome)
Manuel Carlos

Anonymous said...

"Se eram necessarios dois tercos, (julgo que se refere ao foro da PN) para a Constituicao ser aprovada e a Fretilin conseguiu essa aprovacao sem esses dois tercos, entao a Democracia nao foi usada nessa aprovacao, e a Constituicao nao eh legal. Pode-me esplicar como eh que a Fretiln tirou esse coelho da cartola?"
....ó manuel carlos! isso é tudo ignorância ou é mesmo cegueira de quem não quer ver?! então não percebe que a margarida estava a ser irónica? que se a constituição foi aprovada, sendo que o PN não era todo da fretilin, houve efectivamente discussão entre as partes e então a sua aprovação?!
ó manuel carlos, antes de defender a todo o custo o seu lado, sugiro que faça algum trabalho de casa.... é que se a margarida defende abertamente o seu lado, e estando nós, creio eu, pela democracia e liberdade de expressão, o que é certo é não o faz "tirando coelhos da cartola" nem com ignorâncias como a sua.... quer se goste ou não do lado do manuel carlos, o que é certo é para qq conhecedor mínimo de TL, os seus comentários são paupérrimos e em nada enriquecem a discussão.....
do almério

Mau Lear said...

O senhor ALMERIO nao viu que o meu comentario nao era para si?
Foi por cegueira ou por ignorancia (nao sabe ler?)?

Julga que soh a D.Margarida (por quem eu tenho muito respeito)sabe ser ironica?

O que acha do coelho dentro da cartola? Nao eh parecido com a Lei da CLEMENCIA da PN (leia-se Fretilin)?

MAS JAH QUE RESPONDEU quero dizer-lhe que agradeco o seu comentario.

No entanto gostaria de saber qual eh o meu lado no seu entender, pois que ficaria mais ah vontade para no futuro, "democraticamente" (pobre palavra tao maltratada)e em "liberdade de expressao", escrever aquilo que o senhor gosta de ouvir.

Quanto aos meus parcos conhecimentos de Timor Leste, tenho a confessar-lhe que apesar ser a minha terra, nao a conheco tao bem como queria, mas garanto-lhe que conheco muito bem, todos os que A estao usando e abusando em nome dos seus proprios interesses (O GORRO A QUEM SERVIR).

Quanto a discussao eh coisa que soh faco com quem o sabe fazer.
Manuel Carlos.

Anonymous said...

Parabéns senhor José Matoso. Fizestes um trabalho exepcional.Recolhestes com carinho para a nossa geração o que os heróis timorenses alcançaram com a própria vida. Espero que nós os timorenses saibamos ter o espírito de reconciliação entre nós e trabalhar juntos para (re)construir um Timor livre onde todos nós possamos viver como irmãos entre nós e em união com toda a Comunidade Internacional. É verdade que foram 24 anos cercados de terra, mar e ar mas uma única coisa prevaleceu: a unidade. A história dirá. O que nos interesse agora é estudar profundamente esta história para não cair nos mesmos erros. Vamos deixar de apontar dedos. Já basta. Cuidemo-nos não só de saúde, mas integralmente para sabermos cuidar com as pessoas com quem convivemos e assim
a Unidade, a Democracia e a Paz prevalecerão entre nós. Nicholas