Friday 15 June 2007

Plano de Força Naval com mísseis incomoda a Austrália


O caderno estratégico das forças armadas timorenses prevê uma Força Naval Ligeira com fragatas e corvetas, "incorporado com mísseis terra-terra e terra-ar", uma hipótese que mereceu a condenação da Austrália.


"A Força Naval Ligeira deve possuir uma capacidade de desencorajar qualquer acto de humilhação do Estado de Timor-Leste no mar, ou atentatório dos seus interesses vitais", lê-se no caderno estratégico para o futuro das forças armadas timorenses, mais conhecido como relatório "20/20".

"Deve, também, permitir a participação nas alianças em que o Estado se venha a comprometer, com eficácia e dignidade".

"No quadro do relacionamento de Timor-Leste com o mar, defende-se que o país deve dispor de uma Força Naval Ligeira com quatro vectores principais a desenvolver sistematicamente de uma forma integrada", refere o relatório.

O quarto vector dessa Força refere "navios combatentes (classe de fragatas e corvetas, incorporado com mísseis terra-terra e terra-ar)" e apoiada por um "núcleo de navios patrulha oceânicos, unidade de helicópteros de apoio e ataque, radares e sensores da última gama, Fuzileiros Navais e mergulhadores para contra-medidas de minas".

O documento confidencial, a que a Lusa teve acesso, foi concluído em Julho de 2006 - já depois da crise política e militar que afectou as forças de segurança, com confrontos entre forças militares e policiais.

Apenas um círculo restrito de titulares políticos e de diplomatas conhece até agora o relatório da "Força 20/20", como é também conhecido.

Outro vector da Força Naval, considerado mais urgente, é a aquisição de navios de patrulha costeiros e lanchas de desembarque médias "de baixo custo de investimento e de operação e manutenção".

O relatório "20/20" propõe também a criação da Força Operacional de Combate Naval (Fuzileiros Navais), peça privilegiada no desenho das Forças Armadas orientadas para a defesa do mar e dos recursos, sobretudo na costa sul, do Mar de Timor, onde se situa o "offshore" do petróleo e gás natural que tem sido matéria de disputa com a Austrália.

"Os Fuzileiros Navais constituem uma capacidade que terá de garantir o exercício de autoridade do Estado no mar a partir da terra, com um conceito de emprego articulado com a Força de Defesa Marítima (FDM/Marinha) que vier a ser articulado".

A Componente Naval ocupa o lugar relevante no horizonte estratégico das forças armadas timorenses, apesar de o caderno referir a "herança" da guerrilha e considerar, em cada valência da futura Força, os ensinamentos de 24 anos de resistência à ocupação indonésia, além de se preocupar com a segurança da fronteira terrestre com a Indonésia.

Enquanto não estiver constituída a capacidade da Força Naval Ligeira, o Estado "poderá equacionar um mecanismo de cooperação técnico militar (nível táctico operacional) no âmbito de acordos bilaterais com vista à criação sistemática e exclusiva desta capacidade (Franco-Português), sendo imprescindível salvaguardar os interesses de Timor-Leste relativamente às questões da Autoridade Marítima", diz o documento.

"As fronteiras marítimas e terrestres (aérea e espacial) são áreas da nossa responsabilidade", afirma o relatório, sublinhando em muitos pontos do longo texto que Timor-Leste reserva para si as tarefas de protecção dos seus recursos e territórios.

O relatório suscitou a condenação liminar da Austrália, após uma notícia do jornal "The Australian", do dia 08 de Junho, com o título "Plano secreto de mísseis para forças armadas de Timor-Leste", sobre o relatório "20/20".

Alexander Downer, ministro australiano dos Negócios Estrangeiros, considerou a estratégia timorense "completamente irrealista" porque Timor-Leste "não pode pagar" uma Marinha de guerra equipada com mísseis e porque o país "deveria concentrar os seus recursos no desenvolvimento da economia, educação e saúde para o seu povo".

4 comments:

Anonymous said...

O Downer agora diz que os Timorenses não podem pagar forças armadas a valer, mas antes dizia que os Timorenses não tinham recursos para serem independentes.

Pudera com os Australianos a roubarem, de facto não podiámos ter nada, mas precisamos de forças armadas precisamente para que não possam continuar a roubar-nos.

Anonymous said...

PARTE II
O modelo de Forças Armadas para Timor-Leste

Se de facto o autor do artigo teve acesso ao Plano “Força 2020” poderá constatar que, naquele documento, são analisadas várias opções para apoiar a decisão dos órgãos de soberania sobre o modelo de Forças Armadas para Timor-Leste. Tendo em conta a informação obtida, através de fontes crediveis e, sem entrar em detalhe, é muito importante que os timorenses e parceiros do desenvolvimento saibam o seguinte:

As Forças Armadas de Timor-Leste devem reunir um conjunto de características aceites pela Comunidade internacional relacionadas com as regras jurídicas gerais que estão integradas na Constituição e devem ser encaradas como suporte, instrumento de preservação da paz e elemento de estabilidade na resolução dos conflitos e tensões. Aliás, como acontece na maioria dos países democráticos, nomeadamente a Austrália.

As Forças Armadas que o país deve dispor assim como as suas capacidades e respectivas prioridades, devem ter em consideração a sua posição geoestratégica, tendo em conta o ambiente estratégico, as ameaças que podem com probabilidades afectar o país e os interesses nacionais que devem ser defendidos. Aliás, como também acontece na maioria dos países democráticos, nomeadamente a Austrália.

O desenvolvimento das F-FDTL foi considerado como parte integrante do processo para a independência. Também nesta delicada área, o empenhamento dos timorenses será determinante, pois as Forças Armadas deverão reflectir os valores e princípios de defesa de um Estado democrático. Esta transição indispensável exige dois elementos: a participação, envolvimento e responsabilização dos timorenses – a timorização e a capacitação dos recursos humanos e o tipo de dispositivo de defesa. Não é isto que o governo australiano pretende pelos motivos que iremos analisar na Parte III.

No âmbito das opções deve ser dada especial atenção e tomadas em consideração as características físicas e geográficas do país e a necessidade de assegurar meios que permitam a vigilância marítima e aérea do Espaço Estratégico de Interesse Nacional (Existem violações sistemáticas do espaço aéreo e marítimo! Será que isto seria possível na Austrália ou Indonésia? Claro que NÃO)

Timor-Leste está empenhado em desenvolver, nos vários patamares de acção nacional e internacional, um papel construtivo para a paz e a segurança na região e no mundo. Este deverá ser o fundamento e a essência do enquadramento das Forças Armadas de Timor-Leste, isto é, deverá ser considerado crucial a estreita coordenação e sintonia entre a Estratégia de Segurança e Defesa Nacional e a Estratégia Diplomática. Trata-se de uma necessidade básica: ganhar a paz e a estabilidade para assegurar um desenvolvimento sustentável e estável que garanta ao Povo o merecido bem-estar. Também não é isto que o governo australiano pretende, porque de facto receia que Timor-Leste seja um país com estabilidade e desenvolvido.

Assim, tendo em conta a natureza dos desafios que se colocam à Segurança de Timor-Leste, a Defesa Nacional dependerá essencialmente, das suas capacidades militares articuladas com a eficácia da sua política externa e da sua capacidade de construir a rede complexa das relações bilaterais e multilaterais. Portanto, os principais vectores da definição da estratégia de Segurança e Defesa Nacional deverão ser a dissuasão e a diplomacia. Curiosamente este aspecto não foi referido no artigo, porque o governo australiano pretende confundir a opinião pública australiana, timorense e, se possível, a internacional.

No âmbito da estratégia de Segurança e Defesa Nacional, torna-se necessário estabelecer a relação entre o conceito de fronteira e segurança no contexto regional. Actualmente a fronteira da segurança não coincide com a fronteira geográfica e, tendo em conta os desafios actuais, a segurança de Timor-Leste deve também ser encarada no contexto regional através de relações bilaterais e multilaterais. Será que o governo australiano pretende também encarar a sua segurança num contexto regional, através de uma verdadeira cooperação estratégica entre os países do Sudeste Asiático?

A defesa nacional não pode nem deve ser vista apenas com carácter militar e deve de ser encarada de forma integrada e interministerial, global e permanente para atingir o objectivo do estado que é a segurança nacional, e por isso não deve ser encarada apenas numa perspectiva economicista. Aliás, como também acontece na maioria dos países democráticos, nomeadamente a Austrália.

Importa ter presente, que há complementaridade entre segurança e desenvolvimento: não há desenvolvimento sem segurança, e sem esta o crescimento e a própria identidade nacional podem ser postos em causa. As F-FDTL podem colaborar no desenvolvimento nacional, apoiando a população sem colocar em causa a sua missão principal. A contribuição das F-FDTL deve:
- Fazer uso do seu crédito histórico;
- Cumprir a sua missão constitucional e as missões específicas, onde se devem incluir as de interesse público, que deverão ter um adequado enquadramento legislativo;
- Assegurar o apoio à população, através de acções de Cooperação Civil-Militar sem por em causa a sua missão principal.

A Grande Estratégia Nacional só poderá ter êxito na opção pelo vector Mar, ou seja a de afirmação posi¬tiva do País para o lado do Mar e poderá vir a ser um contributo deci¬sivo para o país triunfar no desafio da opção regional. É que, mesmo na opção regional, o grande projecto nacional continua a ser Timor-Leste, e o caminho certo para a sua realização passa, indispensavelmente, pelo Mar, que deve ser tomado como essencial para um maior desenvolvimento sustentado e consequentemente com maior estabilidade e melhor nível de segu¬rança; Mas isso tem de constituir um Objectivo Político Nacional. Em termos de estratégia, isto é completamente antagónico aos objectivos estratégicos do governo australiano.

Na definição da Estratégia de Segurança e Defesa Nacional, o Mar e, consequentemente, a capacidade Naval serão vectores fundamentais. Assim, a estratégia naval será decisiva, pois Timor-Leste tem uma dupla necessidade vital do mar. É que, se por um lado a manutenção da sua própria identidade depende do aproveitamento dos traços caracterizados pela raiz marítima, também a importância económica do mar, nomeadamente o Mar de Timor é essencial para a sua sobrevivência. Neste âmbito, importa referir que o país perde cerca de 30-50 milhões de USD por ano na exploração da pesca ilícita. Claro que esta situação não preocupa o governo australiano que, curiosamente, está muito preocupado com os níveis de pobreza que existem em Timor-Leste e, por isso, entendem que devem influenciar ou determinar a forma como o governo timorense pretende conduzir os seus investimentos.

Explorar potencialidades e atenuar vulnerabilidades de Timor-Leste, para fazer dele um país criador de riqueza em liber¬dade, isto é, competitivo e seguro, obriga de facto, a dis¬por-se duma Grande Estratégia Nacional, ou conjunto de Objectivos Nacio¬nais Permanentes (históricos e conjunturais) que visem apontar o País na direcção das “aspirações universais” de Segurança, Desenvolvimento e Justiça. Essa Grande Estratégia Nacional só será possível, quando o País estiver organizado em função marítima – o “género de vida nacional” - explorando a linha do maior desenvolvimento e, simultaneamente, da maior segurança. Este vector também é claramente contrário aos objectivos estratégicos do governo australiano.

Neste contexto, parece ser da maior conveniência para Timor-Leste procurar informar a opinião pública nacional - a qual deverá ter crescente influência na gestão dos interesses nacionais - quanto ao valor do Mar para Timor-Leste no concernente a desenvolvimento e segurança, e quanto à necessidade de se compatibilizarem as opções regional e vector mar, como atrás se referiu. E ainda quanto aos riscos que se correm no caso de não se tirar partido das excepcionais potencialidades marítimas do País, de outros como a Austrália o estarem a concretizar ou virem a fazer, com prejuízo do povo timorense quanto ao seu próprio desen¬volvimento económico, à sua dignidade e à sua segurança.

Timor-Leste é um país democrático e soberano, porque tem poderes legítimos e as instituições governativas democráticas que lhe permitem, em condições normais, exercer a soberania em qualquer parte do seu território na defesa dos interesses do Estado e da Nação conforme previsto na Constituição. Assim, está em condições de poder reivindicar o poder de julgar os seus próprios conflitos, de impor a sua própria concepção em relação aos seus direitos, de regular a sua vida económica e evoluir nas suas relações internacionais. Aliás, como também acontece na maioria dos países democráticos, nomeadamente a Austrália.

Portanto, é dentro do quadro democrático que caberá ao poder político e aos seus representantes eleitos, definir e tomar as decisões que melhor sirvam os interesses nacionais, nomeadamente nos assuntos relativos à Segurança e Defesa Nacional. Sendo assim, é fundamental que sejam reconhecidas e avaliadas com rigor as vulnerabilidades e potencialidades com interesse para a segurança e defesa de Timor-Leste, tendo em conta a análise dos factores de situação como o geográfico e humano, económico e político/administrativo. A Austrália não pode ser condenada por ter objectivos estratégicos perfeitamente aferidos, mas é criticável não querer que os outros países da região tenham os seus próprios objectivos estratégicos no âmbito da Segurança e Defesa Nacional.

No âmbito dos Objectivos Nacionais de Segurança, que estão expressos na Constituição, importa referir, que qualquer Estado tem como legitimidade, para sustentar a sua soberania, conceber um sistema de defesa e segurança com capacidade efectiva para conter influências ou ameaças directas ou indirectas, que poderão surgir no seu território e espaço de responsabilidade. Por isso, qualquer Estado soberano reivindica o poder de julgar as suas próprias controvérsias, de impor os seus direitos, regular a sua vida económica bem como possuir a sua Política de Defesa Nacional. Aliás, como também acontece na maioria dos países democráticos, nomeadamente a Austrália.

Para que seja possível avaliar as ameaças, torna-se necessário a definição do sistema e institucionalização dos Serviços de Informações, tendo em vista um adequado fluxo e gestão da informação, entre as instituições com responsabilidades na Segurança e Defesa Nacional, que permita uma correcta avaliação da ameaça. Aqueles serviços poderão funcionar como um factor multiplicador e um verdadeiro sistema de detecção e alerta. No entanto, torna-se necessário criar mecanismos político-institucionais, tendo em vista o seu adequado enquadramento legislativo, que lhes confira credibilidade, através de um adequado controlo e fiscalização da sua actividade. Claro que, obviamente, esta vertente também é perfeitamente antagónica aos objectivos estratégicos da Austrália, que quer ter os seus serviços secretos sempre muito activos, mas não aceita que os outros países da região necessitem de obter informação de carácter estratégico.
Alfredo Ximenes

Anonymous said...

COMENTÁRIO AO ARTIGO DO AUSTRALIAN NEWS (08JUN07)
“Plano de Defesa Irrealista” – “Plano Secreto de Mísseis”

Nota: Por lapso só agora segue a PARTE I

Introdução
O presente comentário é referido ao artigo publicado em 08JUN07 pela edição electrónica do jornal “The Australian” com o título “Secret Missile Plan for East Timor” e que apareceu na imprensa sob o titulo “East Timor Military Blueprint Unrealistic: Downer”. Sei que o vosso Blog é de reconhecida isenção na forma como relatam as noticias e no entendimento do que deve ser um órgão de comunicação social, cujo principal objectivo é informar (transmitir o que se passa e não o que se houve dizer), o que não significa abdicarem da linha editorial assumida.
Sou um timorense naturalizado australiano, que vive há alguns anos em Camberra. Felizmente tenho uma boa rede de amigos em diversos sectores da sociedade timorense, portuguesa e australiana e, por isso, tenho acompanhado muito de perto a crise que se vive em Timor-Leste Depois do artigo que li não resisti a fazer o meu comentário, que poderá não ser aprovado pelo autor do Blog correndo o risco de não vir a ser publicado. No entanto, foi a forma que encontrei de tentar dar o meu contributo para o esclarecimento da opinião pública timorense e internacional. Sei que o comentário é um pouco extenso, por isso o divido em três partes: análise do artigo, o modelo de Forças Armadas para Timor-Leste e a relação entre a estratégia australiana e a crise politico-militar que se instalou em Timor-Leste. Depois da Parte III tenciono apresentar uma compilação das referências públicas de Xanana Gusmão e do actual Presidente da República (Ramos Horta).

PARTE I
Análise do artigo
Alguns media australianos não passam de “caixas de ressonância”, fazendo a ampliação dos interesses estratégicos do seu governo, através de ligações perigosas a elementos dos serviços secretos, que dessa forma vão fazendo autênticas campanhas de contra-informação ou desinformação orientada. Desde o início da crise politico-militar que essas campanhas visam desacreditar o governo timorense e o Estado de direito procurando fragilizar as instituições, através da utilização de argumentos falaciosos com objectivos e intenções de carácter duvidoso. É dentro dos parâmetros mencionados que se enquadra o artigo de Mark Dodd publicado no “The Australian”, em que as afirmações do jornalista e os comentários do Ministro dos Negócios Estrangeiros (Alexander Downer) procuram confundir a opinião pública fazendo afirmações que não conseguem provar, pois como o Plano “Força 2020” não terá sido divulgado publicamente, entram em puras especulações, que não podem nem devem ser confundidas ou justificadas com a liberdade de imprensa.

Como é possível aquele jornal ter tido acesso a um documento do governo timorense, de carácter estratégico, se no próprio artigo refere que teve distribuição restrita? Ou estão a fazer “bluff” ou de facto, conseguiram obter o documento, através da tal promiscuidade com os serviços secretos o que não deixa de ser grave e preocupante, mas de certa forma normal em Timor-Leste (quem estiver interessado poderá analisar com mais detalhe as ligações daquele jornalista e dos proprietários do Jornal com os meios politico-militares australianos). Fui informado que o Plano foi distribuído aos Embaixadores acreditados em Timor-Leste. Esta situação deveria exigir uma intervenção enérgica dos políticos timorenses ao mais alto nível o que, estranhamente, não aconteceu e por isso vão perdendo credibilidade também ao nível internacional. No entanto, basta ter presente o que tem sido referido pelo actual Primeiro-Ministro e Presidente da República de Timor-Leste, nas suas intervenções a diversos níveis, que consideram como uma das prioridades a reforma do sector da segurança, que também é apoiada pela ONU e outros países no âmbito bilateral.

Já agora se tiveram acesso ao tal Plano seria importante lerem com atenção o Prefácio escrito pelo Dr. Ramos Horta que, de acordo com fontes do governo, considera o Plano “Força 2020” “um trabalho louvável e contributo imprescindível para o levantamento das necessidades das Forças Armadas timorenses, apontando os desafios que se lhes colocam nos tempos modernos”; Para além disso, refere expressamente que o “notável documento sobre o desenvolvimento das Forças Armadas, identifica exactamente os mesmos desafios” considerados pelo actual Presidente da República como fundamentais para que toda a sociedade timorense se empenhe na consolidação das F-FDTL como vector importante do desenvolvimento do país. Assim, talvez o Chefe de Estado possa explicar ao governo australiano que já chega de interferências e ingerências nos assuntos internos do país, pois ele próprio considera “imperativo tomar as medidas adequadas para a modernização das F-FDTL” como também terá sido escrito no referido Prefácio.

A Austrália teve oportunidade de interferir e apoiar o desenvolvimento do sector da segurança no âmbito multilateral (ONU) e bilateral; No entanto, não foi por falta de especialistas militares, altamente qualificados, que não concretizou o apoio efectivo, mas sim porque os seus objectivos estratégicos passavam por impedir a existência de Forças com credibilidade para assim poderem interferir nos processos de decisão e na soberania nacional. A ONU também falhou, como já foi assumido ao nível internacional, porque não é uma organização imparcial como seria suposto, uma vez que depende dos financiamentos de países como os EUA e Austrália e, por isso, está manietada pelos objectivos estratégicos daqueles países.

Acima de tudo interessava a fragilidade das Forças de Segurança, especialmente das F-FDTL, aproveitando esse facto para criar a instabilidade política, militar e sócio-económica, que levou à grave crise politico-militar como se vai demonstrar neste comentário.
Não deixa de ser curioso e estranha a preocupação manifestada pelo governo australiano em relação à pobreza. Pode ser considerada, no mínimo, de carácter duvidoso, pois devia corresponder a uma verdadeira solidariedade para com o povo timorense, o que até à data não aconteceu, se tivermos em conta a sua atitude e comportamento no âmbito da discussão da fronteira marítima e em relação à exploração dos recursos do Mar de Timor, que prejudicam claramente os interesses dos timorenses. Já agora não deixa de ser pertinente colocar a seguinte questão: onde esteve a solidariedade do governo da Austrália durante 24 anos de ocupação Indonésia e grande sofrimento do povo Maubere?

Neste contexto, importa ressalvar a solidariedade do povo australiano, que não pode nem deve ser confundida com as posições do seu governo, no âmbito da politica externa, que têm vindo a contribuir para o declínio da sua reputação internacional e consequente redução da influência regional. Enfim, a hipocrisia politica acabará por afectar, irremediavelmente, a credibilidade do governo australiano que não tem olhado a meios para atingir os seus fins e que, por certo, acabará por ser penalizada pela opinião pública australiana e organizações internacionais.

O Plano “Força 2020”
Tendo em conta fontes seguras ligadas ao governo timorense talvez seja importante referir os seguintes aspectos relacionados com o Plano “Força 2020”, que foram omitidos no artigo:
- O estudo que esteve na origem da formação das F-FDTL (designado “Kings College”) foi elaborado com intervenção directa dos australianos, ingleses e americanos e revelou-se perfeitamente desajustado aos interesses timorenses, não permitindo a consolidação e desenvolvimento harmonioso, equilibrado e sustentado das F-FDTL como facilmente se pode constatar após 5 anos da sua criação (os factos falam por si). Os problemas da Instituição têm origem na sua criação e na falta de apoio financeiro e de assessores por parte da ONU, influenciada pelo governo australiano, que pressionou a comunidade internacional, no sentido de não existirem Forças Armadas em Timor-Leste mas apenas uma Força Policial (a PNTL teve apoio de milhões de USD e cerca de 160 assessores);
- O Plano “Força 2020” foi elaborado por um grupo multinacional onde também estiveram incluídos militares australianos que, portanto, não foram excluídos ou impedidos de dar o seu contributo como refere o artigo;
- Não está previsto nenhum programa de aquisição de helicópteros armados ou mísseis, apenas a longo prazo poderá vir a ser constituído um grupo de helicópteros ligeiros vocacionados para as missões de interesse público, nomeadamente carácter humanitário (evacuação) e no âmbito da Busca e Salvamento;
- O vector Mar surge como a grande prioridade do país e, consequentemente, da estratégia da Segurança e Defesa Nacional o que implica o desenvolvimento da Componente Naval das F-FDTL; Neste âmbito estará de facto previsto a constituição de uma Força Naval ligeira para patrulhamento e fiscalização das águas territoriais e Zona Exclusiva Económica, onde se encontram os importantes recursos para a sobrevivência e desenvolvimento sustentado de Timor-Leste. Será que o país não tem direito a fiscalizar as suas águas territoriais como acontece com a maioria de outros países da região, nomeadamente a Austrália e Indonésia (o governo australiano pretendia que fossem os seus navios a patrulhar e fiscalizar as águas timorenses como está expresso no estudo “Kings College”, ou seja uma transferência da soberania que, pelos vistos, não preocupa muitos responsáveis políticos;
- A reorganização das unidades de Infantaria será concretizada, tendo em vista a imperiosa necessidade de as Forças Armadas se articularem em unidades de escalão mais reduzido, que permitam a sua implementação em todo o território nacional, com maior operacionalidade e capacidade de resposta, aproximando os militares das populações e da PNTL obtendo, assim, uma confiança acrescida dos timorenses. As unidades terão de ser mais vocacionadas para as acções de cooperação civil-militar e empenhamento no âmbito das operações humanitárias e de apoio à paz;
- O reajustamento do conceito de Reserva através de uma melhor integração dos veteranos será também uma das prioridades;
- A formação e gestão dos Recursos Humanos, sendo uma área crítica, são consideradas como a principal prioridade para o desenvolvimento da Defesa Militar, pelo que será analisada com especial atenção e considerada como dos principais investimentos na Estratégia de Defesa Nacional.

São estes factores que, de facto, preocupam o governo australiano e levam a considerar o Plano “Força 2020” irrealista, desenvolvendo uma campanha delineada por especialistas em contra-informação e devidamente articulada com a imprensa, no sentido de promover a descredibilização daquele Plano e desacreditar o governo que o tenciona implementar. Este tipo de intervenção não deve constituir surpresa, pois está em perfeita sintonia com a estratégia australiana estabelecida para a região, que irei abordar na Parte III deste comentário.
Alfredo Ximenes

Anonymous said...

COMENTÁRIO AO ARTIGO DO AUSTRALIAN NEWS (08JUN07)
“Plano de Defesa Irrealista” – “Plano Secreto de Mísseis”

PARTE III
Estratégia Australiana

Da leitura do artigo conclui-se apenas ser dito um facto, que é uma realidade já constatada “...Camberra deseja controlar o sector da segurança timorense…”, utilizando todos os meios possíveis, mesmo os ilícitos, o que é uma verdade indesmentível como se procura demonstrar nos parágrafos seguintes:

A crise politico-militar em Timor-Leste traduz uma clara situação de luta pelo poder, a que não é alheia a afirmação de interesses externos (estrangeiros). Os acontecimentos na capital timorense vieram sublinhar, por outro lado, as fragilidades de um Estado que cumpriu cinco anos de existência e que se encontra entre os mais pobres do mundo, com 40% da população a viver no limiar da pobreza e um rendimento per capita inferior a 300 USD.
O que está em causa em Timor-Leste não é se este Estado tem ou não condições para ser viável, e se os seus dirigentes são capazes de ultrapassar divisões e não ceder à tentação de se transformarem em agentes de estratégias induzidos do exterior; o que se tornou hoje relevante é saber até que ponto interesses externos ao país (estrangeiros) poderão condicionar ou determinar as orientações políticas e a acção governativa naquele país.

A dimensão da violência, que se verifica desde 2006, indica de forma objectiva que, desde o início, não estavam em causa reivindicações de ordem corporativa e social. O objectivo era o de paralisar o funcionamento das instituições, acentuar problemas reais e demonstrar a ineficácia do governo e das forças de segurança. O objectivo era, no fundo, forçar uma mudança de executivo e tornar evidente para o mundo que Timor-Leste é um “Estado frágil”– conceito empregue em documentos da política externa australiana para designar países em que Camberra protagonizou ou participou em intervenções militares (por exemplo, as Ilhas Salomão, o Afeganistão ou o Iraque) e que utiliza também para definir aquele território.

A crise política em Timor-Leste serviu para Camberra demonstrar a real possibilidade de se materializar um “arco de instabilidade” – conceito recorrente em declarações de dirigentes australianos e que define um cenário em que certos países ou regiões em torno da Austrália poderiam transformar-se em santuários de grupos terroristas ou plataformas de trânsito de droga e lavagem de dinheiro sujo; uma situação que poderia pôr em causa interesses de Camberra nessas áreas ou desestabilizar a própria Austrália.
Neste quadro, torna-se relevante citar um documento de política estratégica das forças armadas australianas, parcialmente divulgado em 2001 por alguns media daquele país, em que são delineadas de forma clara as intenções de Camberra em relação a Timor-Leste. A “Austrália deve prosseguir os seus objectivos estratégicos” no território, “nomeadamente negando o acesso e a influência” a interesses concorrentes. “O propósito de negar acesso e influência assenta no princípio de que nenhuma potência estrangeira deve possuir larga margem de manobra para se imiscuir em Timor-Leste, e deve ser colocado em paralelo com o propósito de a Austrália ter uma boa implantação em Timor-Leste, em particular das suas forças armadas. Os interesses estratégicos da Austrália poderão também ser assegurados se a Austrália conseguir ter algum grau de influência sobre o processo da tomada de decisões” em Timor (Isto está escrito). O documento, datado de 10 de Maio de 2001, indica que o objectivo final da actuação australiana deve ser o de garantir que actos ou palavras dos dirigentes timorenses nunca ponham em causa os interesses de Camberra. Nesta perspectiva, pode extrair-se a conclusão que o interesse em afastar Marí Alkatiri resulta do ex-primeiro-ministro timorense ser, eventualmente, um elemento ligado a estratégias concorrentes com as do governo australiano, como Portugal ou com as do governo americano, como a China. Perante as linhas de acção referidas, facilmente se percebe o forte antagonismo e posições assumidas pelo governo australiano em relação à intervenção e apoio desinteressado de Portugal em Timor-Leste o que tem provocado dificuldade e atrito nas relações diplomáticas entre os dois países, mesmo que Portugal vá procurando dissimular o mal estar existente e indesmentível.

No plano externo, pode ser afirmado com toda a certeza, que há interessados no fracasso de Timor-Leste, dispostos a políticas de desestabilização social e política. A Indonésia pode ser um desses actores, mas declarações e actos dos governantes australianos ao longo do tempo indicam que, na avaliação prospectiva de Camberra, um Timor-Leste viável não é a perspectiva mais do seu agrado. Ou melhor, a viabilidade de Timor-Leste é ou não aceitável para Camberra consoante a sua capacidade para influenciar os acontecimentos no território.
Na presente conjuntura, atendendo ao passado da FRETILIN, às profundas divisões da sociedade timorense e ao modo como certos confrontos foram resolvidos no interior e fora de Timor, não é de excluir que, à medida que o combate político se intensifique, e apesar da presença de Forças Internacionais, não possam surgir situações de confronto aberto. Ou que problemas – como o caso dos ex-militares – não sejam utilizados para novas acções de desestabilização interna. E que persistam os ciclos crónicos de violência que têm marcado a história de Timor-Leste, com todas as consequências negativas daí decorrentes e o consequente impacto negativo na situação de segurança e desenvolvimento integrado e sustentado do país.

Crise Político-Militar
A resolução do problema relacionado com a reorganização e reestruturação do sector da segurança e defesa passa pelo entendimento claro e inequívoco dos factores, que estiveram na origem da crise político-militar em que ocorreram graves confrontos armados dos quais resultaram várias dezenas de mortos e mais de uma centena de feridos. A crise teve causas remotas e recentes, mas teve origem numa estratégia, cuidadosamente arquitectada e multifacetada, promovendo a desestabilização política, militar, social e cultural, através de acções de carácter subversivo (algumas delas desenvolvidas ou coordenadas por assessores militares australianos, bastante chegados a Xanana Gusmão e ao actual Presidente da República – existem registos fotográficos e documentos comprometedores).

A estratégia referida obedeceu a um Plano delineado, que teve como principal objectivo a divisão da sociedade timorense em duas etnias, através de argumentação artificialmente criada, e impedir o normal funcionamento das instituições, tendo em vista a descredibilização do Estado de Direito com a finalidade de interromper o processo político em curso. Para atingir aquele objectivo foi necessário tentar dividir as Forças de Segurança (F-FDTL e PNTL), através do pretexto “Loromonu V Lorosae” e da promoção de conflitos entre aquelas instituições.
Relativamente às F-FDTL as tentativas estão identificadas, desde 2004, mas sem grande resultados, pois os veteranos, principal alvo, mantiveram a sua coesão. No entanto, em relação à PNTL, foi plenamente atingido, uma vez que, após a falência da sua hierarquia (28ABR06), verificou-se a acelerada deterioração da manutenção da lei e ordem e a total desintegração daquela importante instituição, garante da segurança interna, que teve o apoio privilegiado da ONU e Austrália, e onde foram consumidos milhões de USD como já referido anteriormente.

No âmbito das várias investigações efectuadas seria muito importante ter sido indagado, com seriedade, o motivo e âmbito das acções de subversão identificadas na PNTL e F-FDTL, desde 2004, e a quem interessava a fragilidade das Forças de Segurança, especialmente das F-FDTL e quem se aproveitou desse facto para criar a instabilidade política, militar e sócio-económica, que levou à grave crise politico-militar (verifique-se com atenção as movimentações e ligações de alguns militares australianos. Curiosamente as unidades sedeadas em Los Palos, onde se verificaram os maiores problemas das F-FDTL, tinham como assessores militares australianos o que poderá constituir apenas uma coincidência, que valerá a pena analisar detalhadamente e com toda a imparcialidade). Assim, face à impotência ou incapacidade revelada por parte dos militares australianos para assessorar convenientemente as unidades das F-FDTL, o governo australiano não tem autoridade para emitir opiniões depreciativas ou tentar interferir na reestruturação e desenvolvimento das F-FDTL, que tem sido liderado pelos timorenses.

Neste contexto, é possível inferir, que a frágil estrutura do Estado e as dissenções latentes numa sociedade onde a organização e o funcionamento das instituições se situam ainda muito aquém do desejável, como é o caso das F-FDTL e PNTL potenciam a eclosão, limitada mas recorrente, de conflitos cujos contornos nem sempre se conhecem, mas que constituem uma preocupação pelo facto de se prestarem às mais diversas formas de manipulação ao nível interno e externo

Durante a crise existiram indícios claros de, mais uma vez, ter sido efectuada uma campanha, apoiada por alguns elementos especializados da Força Internacional australiana, com orientações específicas para “branquear” o envolvimento dos elementos da PNTL, referenciados, pois caso contrário implicaria assumirem o seu enormíssimo falhanço e o da ONU no apoio directo àquela instituição que, após a falência da sua hierarquia, ficou completamente desmembrada e onde foram consumidos milhões de dólares.

Assim, uma das grandes preocupações dos responsáveis da Força Internacional australiana tem passado por procurar deixar impunes os elementos da PNTL referenciados, de forma a que alguns dos factos não possam contrariar sua estratégia, continuando a ser referido (até por assessores portugueses), que Timor-Leste necessita apenas de uma Polícia civil e não de Forças Armadas, que são as principais responsáveis pela actual grave crise na óptica de alguma imprensa australiana, que faz da tal “caixa de ressonância” de alguns políticos e das próprias linhas de acção do governo em que também tem sido posto em causa o apoio assegurado por Portugal, nomeadamente na Constituição, capacitação das Instituições e Língua. Curiosamente, os políticos portugueses nem sequer mostram a sua indignação, apesar do enormíssimo esforço financeiro que tem sido feito nos últimos anos, provavelmente sem objectivos estratégicos! Tem de ser assumido que a relação entre os dois países é mais emocional do que racional. O esforço notável que tem vindo a ser feito com a introdução da língua portuguesa, a pedido das autoridades timorenses, provavelmente será inconsequente (vejam o que diz Ramos Horta sobre o Bahasa e até os filhos do Xanana foram retirados da Escola portuguesa!). O que pensará o Embaixador de Portugal de tudo isto? Aqui em Camberra a comunidade portuguesa não entende a passividade das autoridades portuguesas perante os ataques sistemáticos à credibilidade e apoio que Portugal continua a assegurar com grande esforço financeiro (a relação país/PIB comparada com a dos EUA corresponde a um esforço financeiro de 50 biliões de USD ou seja, muito superior ao de todos os outros países doadores).
Alfredo Ximenes

Nota: Serão ainda publicadas as conclusões e uma compilação das declarações de Xanana e Ramos Horta