Pedro Rosa Mendes, da Agência Lusa
Díli, 03 Jun (Lusa) - Há uma multidão à espera "do presidente" em Makadiki, na costa sul, suspensa da rota descendente dos dirigentes da FRETILIN no mapa, porque são raros os sítios com cobertura de telemóvel fora das capitais de distrito.
Em Makadiki, distrito de Viqueque, não há rede e as informações do avanço dos dirigentes chegam, por boca e em mão, pela guarda-avançada da campanha da FRETILIN.
São anúncios trazidos pela estrada que divide o mapa de Timor-Leste em ocidente e oriente, do Taci Fetu ("Mar Mulher", a norte) ao Taci Mane ("Mar Homem", costa sul), no coração da militância do partido maioritário.
"Saíram de Ossú", informa alguém, "saíram de Viqueque", ouve-se mais tarde e, depois disso, é a longa espera, "mais meia hora", diz um deputado nervoso durante várias meias horas, sorrindo, "o presidente não tarda".
A noite instala-se já quando o som de viaturas e sirenes põe Makadiki em histeria, "é ele! é ele! é o presidente!", a multidão precipita-se para a estrada que chega de oeste, há um barulho de buzinas, gritos, palmas, megafones, "segurança atenção! segurança atenção! segurança atenção!", os carros e camiões avançam lentamente, à velocidade dos guardas pedestres que, com camisas da FRETILIN, fazem um cordão de cada lado da estrada.
É a apoteose: "Lu-O-lo! Lu-O-lo! Lu-O-lo! Lu-O-lo!". O presidente que a multidão recebe em delírio é Francisco Guterres "Lu Olo", que, na manhã seguinte, lançou oficialmente em Makadiki a campanha para as legislativas de 30 de Junho.
"Lu Olo" é presidente da FRETILIN. Falhou ser Presidente da República, a 09 de Maio, perdendo as eleições para José Ramos-Horta.
"No plano pessoal, uma derrota é não conseguir a cadeira, é não vencer a cadeira do Presidente da República", afirma mais tarde "Lu Olo" à Lusa, na varanda da casa do administrador de Makadiki, onde ele e o secretário-geral da FRETILIN, Mari Alkatiri, passarão a noite.
"No plano político, a FRETILIN não tem que perder com tudo isso. Continuamos a batalhar para as parlamentares. Estou seguro, seguríssimo, que teremos maior margem para obtermos assentos" no Parlamento, afirmou "Lu Olo" à Lusa.
"Não perdemos completamente. Tivemos apenas um revés mas não perdemos completamente a batalha", acrescentou o presidente da FRETILIN.
"Lu Olo" está descontraído na sua figura pequena, com uma leveza acentuada pelo seu pólo branco, apertado num cinto discreto de cabedal. Mari Alkatiri e outros quadros da FRETILIN descansam, cumprimentam-se e conferenciam na sala atrás. Há uma euforia no ar, que o cansaço da estrada apenas acentua.
Díli, visto de Makadiki, é uma miragem a doze horas de autocarro ou sete horas de jipe. Díli fica, talvez, num outro país. Ou é Makadiki que vive outro tempo: o das lutas do passado e os medos do presente.
"Não vou lá desde 2004", conta Alito, deitado numa esteira, sobre um estrado coberto por um telhado de colmo, onde vai passar a noite com parte da família.
Outros homens, noutros estrados, dormem fora de casa. Em Makadiki "não há mosquitos".
"Não vou lá desde 2004 porque tenho medo", continua Alito, um homem que vive das várzeas férteis da costa sul, como a maior parte da população.
O seu irmão e o seu sobrinho concordam. Também eles não vão à capital desde os incidentes de 2006. "Em Díli não gostam de nós. É uma cidade perigosa para os 'lorosae'", ou timorenses oriundos do leste.
A crise política e militar de 2006 rebentou num contexto de rivalidade entre "lorosae" e "loromonu", os timorenses dos distritos ocidentais.
Os resultados das recentes eleições presidenciais confirmam a divisão do país político: a FRETILIN ganhou nos três distritos do leste, Baucau, Lautem e, com mais do dobro de votos do adversário, em Viqueque, onde "Lu Olo" obteve a sua vitória mais expressiva.
Os dez distritos ocidentais foram ganhos, de forma dispersa, pela oposição.
"Aqui, no suco de Makadiki, tivemos cem por cento", comenta "Lu Olo". Um quadro local do partido adianta-se com os números exactos, esmagadores: 3084 votos para "Lu Olo", 36 para José Ramos-Horta.
Em Makadiki, como na sede do distrito ou em Ossú, a sua terra-natal, onde esperou por Mari Alkatiri, "Lu Olo" está entre os veteranos e os sobreviventes da luta de libertação.
"Vivi com eles, sofri com eles, lutei com eles nos primeiros anos da ocupação militar indonésia. Vi os filhos, os pais, as mães a morrer", diz o presidente da FRETILIN para explicar "a alegria misturada com emoção" da recepção apoteótica em Makadiki.
Muitos dos que, pouco depois, ouvirão os dirigentes da FRETILIN no primeiro "diálogo" de campanha estiveram com o jovem Francisco Guterres na retirada do Monte Matebian, na noite de 22 para 23 de Novembro de 1978, quando a montanha-base da resistência caiu e a população civil teve que ser deixada para trás.
"Lu Olo" refere uma das companhias em que esteve inicialmente no período das bases de apoio e onde "só de filhos desta terra aqui estavam 300 homens armados e 600 civis".
De Uatulari, a poucos quilómetros de Makadiki, "só duas secções sobreviveram até 1999, incluindo quatro mulheres, a senhora Saturnina. Caímos juntos numa emboscada dos indonésios em 1988", vai contando o presidente da FRETILIN.
"Ela está aqui nesta casa, hoje".
"Não há nenhuma família que não tenha perdido alguém e com quem eu não tenha partilhado a dor e o combate", acrescenta "Lu Olo".
É com esta intimidade que "Lu Olo" se lança com Mari Alkatiri no "diálogo" com o povo mais fiel da FRETILIN. Canta-se, de punho fechado em riste, o velho hino do partido, "Foho Ramelau", acompanhado ao sintetizador, numa batida de soldadinhos de chumbo.
"Lu Olo" e Alkatiri falam aos camaradas de desenvolvimento, de crescimento económico, de redução da pobreza, de infraestruturas, de rede escolar, "é preciso dar oportunidade a que o povo tenha acesso ao mercado", "atenção aos que querem vender o país aos estrangeiros!"
Qualquer promessa eleitoral soa redundante neste distrito, porque tudo parece estar por fazer. A miséria é multiplicada pela distância. Makadiki fica num canto longínquo e, no entanto, fértil como poucos no país, com várzeas de arroz, de frutas, com florestas de teca e casuarinas, de campos com búfalos e cavalos.
Tudo, porém, parece faltar e pouco parece ter sido feito, com a excepção imponente das quatro pontes que estão a ser levantadas a lesta de Uatulari, na área de Aliembata.
"Nós não queremos promessas", diz um eleitor da FRETILIN depois do comício da noite em Makadiki. "Só precisamos que o Governo nos faça uma estrada para o norte. Nós produzimos bom arroz aqui mas o Governo enche o mercado de arroz importado".
Para a parte sul do distrito de Viqueque, a nova luz nasce literalmente do chão: em Aliembata, passada a grande ribeira de Babui, já em suco Babulo, na estrada costeira para Iliomar, há uma nascente petrolífera no sopé da montanha, a céu aberto, a trinta metros do mar de coral.
Um projecto do Banco Mundial prevê o aproveitamento do petróleo "onshore" de Aliembata para alimentar a região em electricidade.
A crise de 2006 interrompeu a prospecção e as nascentes de Aliembata, durante décadas usadas pela população local, foram cimentadas "em Setembro ou Outubro" pela companhia estrangeira que fazia a prospecção.
O petróleo resta, portanto, uma miragem, tão próxima que se pode cheirar: as lamas espessas cheiram a gasóleo, um odor irreal no azul do banco de coral que acompanha a costa.
"Aliembata é a nossa grande esperança", diz um dos cinco polícias de Makadiki, Sebastião, que tem um irmão a estudar engenharia química na Índia.
Nas estradas de Viqueque, passa-se por muitas cruzes, etapas de vias-sacras erguidas à beira-caminho. Uma cruz deste género foi atirada para trás da mesquita de Uatulari em 1995, durante a ocupação indonésia, por muçulmanos de Sulawesi, conta o polícia Sebastião. Os católicos responderam, incendiando a mesquita.
"Apanharam seis responsáveis, entre os quais eu". Sebastião passou quatro anos numa cadeia indonésia.
O passado anterior à independência é, no seu caso como no de muitos outros aqui, determinante nas escolhas do presente. No primeiro dia da campanha para as legislativas, 29 de Maio, Sebastião esteve no lançamento da campanha da FRETILIN - em trabalho ou em militância.
Muita gente caminhou horas até Makadiki, passando pelas cruzes da via-sacra. Em Viqueque, num país de muitos resistentes e de muitos católicos, a fé é imune ao calvário.
"Somos uma família política muito unida", resumiu "Lu Olo", tranquilo, antes do início de uma campanha crucial, onde a FRETILIN joga a cadeira do poder e os seus actuais dirigentes jogam a cadeira no partido.
Sunday, 3 June 2007
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7 comments:
""Somos uma família política muito unida", resumiu "Lu Olo",???
Hahaha....
Sao tao unidos que de 56% em 2001 cairam para 27.xx% em 2007. Ou seja mais de metade dos eleitores que votaram para a fretilin em 2001 abandonaram as suas fileiras nas presidenciais de 2007.
Com uma unidade assim nem precisam de inimigos.
Não sabe distinguir os membros de um partido da massa dos seus apoiantes? Olhe que são coisas diferentes.
E o Jose Luis Guterres entre outros tantos da Fretilin Mudanca tambem nao eram membros da CC da Fretilin?
Onde andam agora?
Ou sera que ja os apagaram da historia da Fretilin como se nunca tivessem existido?
Voces sao pateticos quando tentam justificar o injustificavel.
Tem razão este anónimo, além de que foram tantas, tão grandes e tantas vezes repetidas essas mentiras contra a Fretilin e os seus dirigentes, foi tanto o ódio vertido pelo Xanana, Horta, bispos, padres, e tantos mais que com certeza isso desorientou na altura muitos votantes na Fretilin. É que à primeira qualquer cai mas à segunda cai quem quer. Com isto quero dizer que certamente muitos dos que não votaram na Fretilin nas Presidenciais com certeza que já viram o logro em que caíram e estou muito confiante que vão voltar a dar-lhe não só a confiança como também o voto.
É que as pessoas lembram-se que antes desta confusão armada pelo Xanana e Horta com apoio dos Australianos e o trabalho no terreno do Railos, Salsinha, Alfredo e outros desertores - antes desta confusão - havia paz, havia ordem, havia segurança e nesta altura é isto que as pessoas mais querem, a paz, ordem e segurança que tiveram enquanto o Mari Alkatiri foi o Primeiro-Ministro.
É o bem mais precioso, a paz, a segurança, a ordem e quem já o teve como tiveram durante quatro anos com o prieiro governo da Fretilin sabe que só com a continuação da Fretilin no Governo pode continuar a ter. Porque a Fretilin constrói e os outros destróem.
Os anos de paz que se viveram durantes os primeiros anos de governacao da Fretilin foi o seguimento da paz estabelecida primeiro pela INTERFET em 1999 e segundo pela UNTAET ate 2002.
O que aconteceu foi que depois de assumir o poder a Fretilin nao soube manter essa paz e logo comecaram a haver descontentamentos com a maneira como o governo de Alkatiri governava o que acabou por culminar na crise do ano passado.
Tudo por incompetencia e incapacidade do Mari em assegurar a estabilidade do pais e melhorando a vida do povo e mantendo o contente.
A verdade e' que Mari e o seu governo de aprendizes despotas nao souberem dar continuidade a paz estabelecida pela UNTAET. Essa sim e' a verdade.
Quanto ao optimismo da margarida so lhe faz bem. A ultima coisa que desejamos e' ver uma portuguesa de angola a bater as botas com um ataque de coracao causado pela acumulacao de stress.
Mas no entanto estranha me muito ler as palavras da mergarida porque o tom e' tao parecido ao de Mari Alkatiri que nao ficaria nada surpreso se fosse o proprio ou alguem bastante proximo dele.
Esperemos pelas eleicoes e logo veremos se o seu optimismo e' justificavel ou se e' somente um grande desejo irrealista como tem sido ate agora as previsoes de vitorias da Fretilin.
A Fretilin caiu de 56% para 28% ? Que grande aldrabice. Os 56% foram dados pelo Sergio de Melo e seus colaboradores da Untaet e os 28% foram arranjados pela Ana Pessoa e outros ministros a trocar caixas de voto. Agora o povo vai-lhes dar o que merecem, nao mais de 15%. Vamos apostar?
Os anos de paz que se viveram duraram até fins de Abril do ano passado, apesar dos esforços de antes tanto da igreja em 2005 (com manifestações de três semanas seguidas ) como dos amigos e amigas do XG em Dezembro de 2002 (onde para além de destruições de bens estatais também queimaram a casa do Mari Alkatiri).
Só depois do XG e do RH terem apoiado Railos, Alfredo, Salsinha, Tara, Tilman, etc. é que a violência incendiou Díli outra vez. Para darem o pretexto que tanto XG como RH precisavam para aparecerem como salvadores da pátria. Estes dois fizeram o mal e a caramunha.
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